Monday, April 01, 2013

Paris não existe mais

Você me roubou Paris. A cidade não existe mais sem corridas descalças, em plena madrugada, pelos vários pavilhões da Cité U. Sem dança em cima do mapa ou do canteiro na entrada, enquanto passam dois chineses desavisados que vão ficar só até o fim do verão. Você roubou um cenário dos meus futuros possíveis romances. Como a gente faz, se não houver uma cozinha com gente do mundo inteiro? Um preparando sanduíche. O outro, ensopado de peixe com camarão.

Como faz sem manhãs onde aquele casal - o francês e a espanhola - ocupam a mesa inteira com camembert e saucisson sec? Sem picnics nos dias de sol. Sem invadir jardins reais, sem cinema en plein air. Paris não existe se você não ficar na rua até tarde, tentando descobrir um jeito de voltar pra casa, porque o RER já fechou. Sem um amigo que vá passear pelo quartier chinois no XIIIème com uma camiseta de Mao Tsé-tung censurado, sem nem se ligar.

Uma Paris onde você compra mil cervejas pra trocar o dinheiro de recarregar a carte Navigo. E pega o trem bebendo sem parar. Uma Paris menos Paris, da banlieue, onde um cara pode até pedir um pedaço do seu kinder bueno. Uma Paris onde você ajuda um alemão e um indiano a chegarem ao seu destino, porque eles não falam francês e acham muito complicado se orientar no metrô.

Uma Paris como lua de mel. Uma com manhãs preguiçosas, tardes de (re)descoberta e festas com música brasileira ruim. Uma de fumo mal enrolado, de muitos cigarros, de vinho como se fosse água. Uma Paris que comporte um estudante de química que goste de Julio Iglesias, queira ser perito forense e more na Maison du Cambodge - porque, afinal, coerência é a gente quem inventa.

Paris. Essa cidade vibrante, maravilhosa, que não existe mais.